Joseph- Maurice Ravel
Homem do Bolero revela ecletismo
Colaboração para a Folha Online
"A tradição é a personalidade dos imbecis". Esta célebre frase retrata com fidelidade o perfil de Joseph-Maurice Ravel, que em seu tempo ganhou a fama de "revolucionário perigoso". Na verdade, de perigoso Ravel não tinha nada. Era apenas um músico com extrema complexidade técnica, que conseguia criar sons orquestrais ecléticos como ninguém, o que evidenciava sua condição de fã assumido do compositor Claude Debussy.
Filho do engenheiro suíço Pierre Joseph Ravel e da fidalga francesa Marie Delouart Ravel, Joseph-Maurice Ravel nasceu na cidade de Ciboure, nos baixos Pirineus, em 7 de março de 1875. Começou a receber as primeiras aulas de piano aos sete anos, junto com o irmão Edouard, três anos mais novo. O interesse pela música chamou a atenção dos pais que, em 1889, o matricularam no tradicional Conservatório de Paris.
Apesar da vontade de aprender, Ravel nunca aceitou muito bem as aulas coletivas e, após uma década de aprendizado em classe, passou a estudar sozinho as regras de composição. Durante anos se preparou para concorrer ao Grande Prêmio de Música de Roma, evento que consagrava novos talentos.
Considerado um dos favoritos à conquista em 1900, sofreu sua maior decepção ao ser derrotado. Nunca se conformou, e desde então passou a ser uma pessoa arredia, chegando a recusar a Legião de Honra, principal condecoração francesa. Não freqüentava eventos sociais, apesar de viver no auge da belle époque européia, preferindo dedicar sua vida inteiramente ao trabalho musical.
Nesta época, Ravel confidenciou aos amigos que precisava criar uma obra especial, que caísse no gosto do público e, ao mesmo tempo, agradasse a crítica. Foi quando compôs em 1903 o famoso ciclo de canções Shéhérazade. Obteve relativo êxito, mas só alcançou maior reconhecimento quando apresentou o balé Daphnis et Chloé em 1912, música encomendada pelo coreógrafo russo Diaghilev.
Ravel era dono de certas atitudes infantis, gostava de brinquedos e deixava transparecer em suas obras temas ligados à fantasia, contos de fadas e magias. Um fato facilmente observado na suíte Mamãe gansa, de 1910, música para piano que depois foi transformada e adaptada para o balé.
Ao mesmo tempo, procurava desafios. Compunha peças que exigiam enorme empenho do intérprete, como é o caso da Sonata para violino e violoncelo e do famoso Concerto de piano para mão esquerda, especialmente criado para o músico Paul Wittgenstein, que perdera o braço direito durante a guerra.
Um ano após a morte de seu pai em 1908, Ravel decidiu morar sozinho. Nesse período, compôs sua primeira ópera, L' Heure espagnole, e iniciou uma fase de trabalho fértil.
Infelizmente, fortes abalos emocionais, como a morte da mãe em 1917 e algumas decepções amorosas, foram minando suas forças. Mesmo assim persistia, e em 1928, a pedido da bailarina Ida Rubinstein, compôs sua mais aclamada obra, Boléro.
Os amigos mais chegados, preocupados com a sua falta de ânimo, organizaram várias viagens, inclusive até Marrocos, a fim de distraí-lo. Mas um acidente de automóvel, em 1932, deixaria seqüelas irreversíveis. Sua memória foi afetada e a coordenação dos movimentos jamais seria a mesma.
Fortes dores de cabeça passaram a atormentar o músico. Em 1937, os médicos resolveram submetê-lo a uma cirurgia cerebral. Depois dela, Maurice Ravel nunca mais recobrou a consciência. Faleceu no dia 28 de dezembro do mesmo ano, no pico do inverno francês. Com ele, morria o último grande mestre clássico da música européia.
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