Georges Bizet
Música incorpora escória e passionalidade
Colaboração para a Folha Online
A novela Carmen, escrita por Prosper Mérimée e publicada em 1845, rompeu com os clichês do Romantismo. Sua versão para ópera, composta por Bizet, provocaria efeito semelhante em relação às tradições do teatro lírico. Mérimée foi considerado áspero demais para ser enquadrado na escola literária romântica. Seu poder de síntese, sua linguagem seca, já quase naturalista, seguia o caminho oposto da ficção genuinamente romântica. A música de Bizet provocará um estranhamento similar em seus contemporâneos.
Quando Bizet decidiu transformar em ópera aquela novela de Mérimée, publicada cerca de 30 anos antes, o Naturalismo já era perfeitamente aceito em literatura. Mas o mesmo ainda não acontecia no mundo da ópera, arte em que a fórmula mais ao gosto do público era a de um entretenimento divertido ou, quando muito, feito para glorificar heróis e heroínas imaculadas.
Bizet introduziu a escória e o lado obscuro da vida no teatro lírico. A tragédia a que seus personagens estão submetidos não tem nada de nobre ou edificante, como era comum ocorrer nos trabalhos dos demais românticos. A passionalidade e o ímpeto quase selvagem da personagem Carmen foram traduzidos, por Bizet, em uma música igualmente impetuosa, colorida e carregada de vibrações inusitadas.
"Se não tomarmos cuidado, isso terminará corrompendo totalmente nosso teatro lírico, anteriormente uma criança tão doce e bem comportada em que até podíamos ouvir obras maravilhosas", escreveu um crítico francês após a estréia de Carmen. "O tema dessa ópera é tão repulsivo que alguns dos melhores artistas de Paris recusaram-se a participar do elenco. Na introdução, temos um tema barulhento e ruidoso, que começa de maneira selvagem, sem precedente", observou outro.
Hoje é difícil encontrar alguém, mesmo entre os não conhecedores de música lírica, que ainda não tenha ouvido a abertura e mesmo alguns trechos da obra-prima de Bizet. Melodias como "La Habanera" e a "Canção do Toureiro" estão entre os clássicos mais conhecidos da música universal.
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